De tanto pensar, escrevi

Ainda acredito nas revistas (e nas pessoas)

E o que me distancia da adolescente devaneadora, intensa, emotiva?

Quando a minha revista Capricho chegava, eu ia direto no horóscopo pra saber o que os astros prometiam pra mim naquela semana. Como alguém que usava a última matéria do caderno escolar pra fazer Regências, S.A.P.I.N.O. e descobrir com quantos anos eu iria me casar (entendedoras entenderão), eu ficava de cara com o quanto os astros costumavam acertar. Assim como os testes das revistas, que sempre adivinhavam “se ele estava mesmo a fim de mim”.

Eu gostava de acreditar no que meus olhos não viam. Não duvidava de quase nada nem de quase ninguém. Mudava de ideia a cada opinião alheia, escolhia uma nova profissão a cada dia e já tinha em mente o nome dos meus três filhos. Amava e odiava com muitíssima facilidade. Morria de ciúmes, escrevia na agenda e ouvia a mesma música cinquenta vezes. Tinha as melhores amigas, amigas que eu gostava médio e aquelas que, às vezes, eu queria ser.

O tempo passou, e cá estou eu.

Não leio mais horóscopo, mas acho a astrologia certeira quando me descreve. Continuo sem resistir a testes de personalidade, comportamento e afins — apesar de, às vezes, desconfiar dos resultados. Sigo naquela vida de adulto meio padrão, dividida entre casa, família, trabalho, amigos, boletos, tentar ser fitness, não conseguir e continuar tentando. Isso não é uma reclamação, apenas um fato.

E o que me distancia da adolescente devaneadora, intensa, emotiva?

Outro dia, um acontecimento me fez revisitar minha adolescência. E não foi um reencontro que me levou até lá. Foi uma partida. A partida de um professor por quem eu tinha imensa admiração. Recebi a notícia no início da manhã e passei o resto do dia passeando mentalmente pelos corredores do Colégio Anglo, do Colégio das Irmãs, revendo amigos que há tempos não encontro.

Chorei a partida do meu professor e também a de um tempo.

Minha personalidade saudosista tem dessas: me prende ao que já passou mais do que deveria. Sentir saudade, pra mim, é concluir que o bom do passado deixou marcas e hoje ocupa lugar de porto seguro. Não raramente, me vejo vasculhando caixas de cartas e fotos antigas. Talvez buscando um “eu” mais leve, mais distante de tanto conteúdo interno pra administrar e dar conta.

Mas, no dia em que meu professor se foi, depois da viagem que fiz sentada em minha estação de trabalho, me dei conta de que a adolescente que revi — aquela leitora assídua da Capricho —, em essência, permanece aqui. Viva. Pulsando. Latente.

E depois de chorar e sorrir sentindo saudade, de pensar no tanto que já vivi, nas pessoas que passaram por mim, nas que permaneceram, nas que partiram, nas que só ouço falar… minha conclusão, como uma jovem 40+ que insiste em sentir, é de que amadurecer é ficar mais consciente, sim. Mas levantar defesas é endurecer. Amadurecer nos aproxima da vida com mais responsabilidade e presença. Endurecer nos afasta com medo e rigidez.

E eu, com todos os tropeços e com tudo que aprendi caindo e levantando, continuo acreditando. Nas pessoas, nas promessas, nos astros e até nas revistas.

Sou uma emocionada. Fato. E eu sei que emoção demais, às vezes, atrapalha. Mesmo assim, eu prefiro. A gente faz merda, quebra a cara… e ainda assiminsiste na vida.

P.S.: Se você chegou até aqui, fecha esse momento com “Coisas da Vida”, da Rita Lee.

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