Frases como "Com todo o respeito, mas...", "Olha, é só brincadeira, tá?" ou "Não me entenda mal, mas..." são frequentemente usadas no ambiente de trabalho—quase sempre por homens—e, na maioria das vezes, deixam quem escuta desconfortável e constrangido. Ainda assim, essas situações continuam se repetindo. Não por acaso, o número de denúncias de assédio moral e sexual cresceu 54% no Piauí em 2024.

Foto: Reprodução/Getty Images/iStockphoto

Assédio

O dado vem do Ministério Público do Trabalho (MPT), que registrou, no último ano, 327 denúncias de assédio moral e 24 de assédio sexual, uma média de quase uma reclamação por dia. Em 2023, esses números foram 212 e 15, respectivamente—um salto de 124 casos a mais em apenas um ano, tornando esse um dos maiores crescimentos do país.

• Receba Notícias do Conecta Piauí pelo Whatsapp
• Confira tabelas e resultados dos principais campeonatos.

Para Igor Costa, Procurador do Trabalho e coordenador regional de Promoção de Igualdade de Oportunidades e Eliminação da Discriminação no Trabalho, o aumento das denúncias reflete não apenas o crescimento dos casos, mas também uma maior conscientização da população.

“As pessoas têm identificado quando estão sendo vítimas de assédio e têm se encorajado a denunciar”, pontua.

Segundo o procurador, essas denúncias são essenciais para que as instituições possam investigar e punir os responsáveis.

“As autoridades só podem agir quando são acionadas. Por isso, é fundamental que as vítimas continuem denunciando e apresentem o maior número possível de provas, para que a resposta seja mais rápida e eficaz”, reforça.

O assédio que se esconde sob "brincadeiras"

Muitas vezes, o assédio acontece disfarçado de "comentários bobos", feitos por alguém "brincalhão" e que "te adora". O clássico "mas era só uma brincadeira" já virou argumento de defesa de muitos homens diante de denúncias no setor de compliance de empresas. Mas como saber quando um comentário ultrapassou os limites e se tornou assédio?

Vera Martins, educadora e pesquisadora em comportamento humano, simplifica a questão:

"Quando é brincadeira, todo mundo ri e se diverte, né?"

O primeiro sinal de que algo está errado é justamente o constrangimento sentido pela vítima.

“Nas brincadeiras, há um acordo implícito: ninguém se sente ofendido, e todos se divertem em pé de igualdade. No assédio, só o assediador se diverte”, destaca Vera.

O que caracteriza assédio moral?

O assédio moral engloba comportamentos abusivos—verbais, gestuais ou comportamentais—que geram sofrimento psicológico e emocional no trabalhador. Isso pode incluir:

• Vigilância excessiva
• Tarefas impossíveis de cumprir
• Desconsideração de opiniões
• Xingamentos, insultos e críticas exageradas

Essas práticas impactam negativamente a vida profissional, social e pessoal da vítima, causando desmotivação e sofrimento.

> "Para configurar assédio moral, essas condutas precisam ser repetitivas e intencionais. Além disso, não é necessário que haja hierarquia entre assediador e vítima—o assédio pode ocorrer entre colegas de trabalho, como no caso do bullying corporativo", explica o procurador Igor Costa.

O assédio sexual é crime

Já o assédio sexual está tipificado no artigo 216-A do Código Penal, que define como crime:

“Constranger alguém com o intuito de obter vantagem ou favorecimento sexual, aproveitando-se da posição de superioridade hierárquica ou ascendência inerente ao cargo ou função”.

A pena para esse crime varia de 1 a 2 anos de detenção.

Denunciar é um passo fundamental para combater essas práticas. Quanto mais as vítimas e testemunhas se manifestarem, mais difícil será para os assediadores se esconderem atrás da velha desculpa de que "era só uma brincadeira".